terça-feira, 28 de setembro de 2010

Quotidiano e enamoramento

Relendo Francesco Alberoni:

A vida quotidiana é caracterizada pelo desapontamento. Temos sempre muitas coisas para fazer: algumas de que gostamos; outras, a grande maioria, que nos são pedidas. (...) A ordem das coisas não nos tem como centro, não faz de nós o seu princípio inspirador; é o resultado das pressões que sobre nós se exercem. Aquilo que desejamos verdadeiramente não o realizamos nunca e, a dada altura, acabamos por não saber tão-pouco se o queremos.(...) Nunca nos sentimos compreendidos até ao fundo, nunca nos é dada uma profunda satisfação, jamais os nossos desejos e os dos outros se encontram completamente. É um estado que parece estar sempre para acabar, que julgamos impossível que continue assim, de modo tão estúpido,(...); anos opacos à espera não se sabe muito bem do quê, de desapontamento contínuo; anos sem história, sem felicidade verdadeira, em que "vamos andando".
A profunda atracção que o enamoramento suscita em cada um de nós é devida ao facto de introduzir nesta opacidade uma luz deslumbrante e um perigo total.

Francesco Alberoni, Enamoramento e Amor, Bertrand Editora, 1999

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