terça-feira, 31 de agosto de 2010

Alessandro Bavari - surrealismo

Cansaço...desta sociedade!

Escrever...porque sim.

Palavras dispersas, amontoados de ideias, de sentires, de sonhos e pesadelos. Dar ordem e sentido a tudo isto nem sempre é fácil. Escrever...porque sim, porque é libertador, como as lágrimas ou os sorrisos. É um bater na redoma do eu que me envolve, na esperança que se parta de uma vez por todas e consiga fazer parte de algo, de alguém, do todo ou, simplesmente, do nada que adivinho.

Palavras dispersas, sentimentos que já não sei como expressar, num mundo que se quer calado, mudo e quedo, sem tolerância, sem aceitação da diferença e preso num individualismo que nada tem a ver comigo.

Palavras que ora são rugires de raiva, outras vezes de amor e outras ainda feitas de silêncio...o peso do silêncio, da ausência. Castigos com palavras ou sem elas.

Escrever...porque sim. Porque sem a escrita, sem a palavra, afundo-me num poço sem fim e desejo o nada.

Mãe à beira de um ataque de nervos

Lá diz o ditado popular que "Quem tem filhos, tem cadilhos." Pois é, eu não sou excepção. O que fazer com três adolescentes em casa (um deles adoptivo...ou melhor, eu é que fui adoptada), mais um gato gordo e lustroso que só pensa em comer?! É roupa e mais roupa para lavar e passar; comem que nem alarves...tachos e mais tachos, bolachas...caos! Fugir, emigrar, não posso. Só vejo uma solução - vou fazer um "pente 4", vestir uma farda do III Reich e de pingalim na mão pôr esta malta toda a trabalhar.

Há quem pense que sou feita de granito e de uma resistência inabalável. Engano. Assumo as minhas responsabilidades e até vou aguentando os embates mas, carambas, sou gente...

"Uma das coisas que aprendi é que se deve viver apesar de. Apesar de, se deve comer. Apesar de, se deve amar. Apesar de, se deve morrer. Inlcusive muitas vezes é o próprio apesar de que nos empurra para a frente. Foi o apesar de que me deu uma angústia que insatisfeita foi a criadora da minha própria vida."

Clarice Lispector, in 'Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres'

Ensaio sobre a Liberdade

A Liberdade, enquanto independência do ser humano, é um mito. Para sermos verdadeiramente livres a todos os níveis, teriamos de ter nascido longe da sociedade, longe dos outros. A única liberdade que verdadeiramente conheço é a do pensamento e mesmo essa, quantas vezes por razões éticas, educacionais e outras, a sufocamos.
A Liberdade é um mito pois estamos sujeitos à família, às normas sociais, às leis do Estado e até àqueles que amamos. Por isso, no indivíduo que deseja ser verdadeiramente livre, surgem as contradições, os desesperos.

Sobre esta matéria a filosofia de Sartre vai mais longe - o homem é, antes de tudo, livre. "A liberdade humana revela-se na angústia. O homem angustia-se diante da sua condenação à liberdade. O homem só não é livre para não ser livre, está condenado a fazer escolhas e a responsabilidade das suas escolhas é tão opressiva, que surgem escapatórias através das atitudes e paradigmas de má-fé, onde o homem se aliena da sua própria liberdade, mentindo para si mesmo através de condutas e ideologias que o isentem da responsabilidade sobre as próprias decisões."


Regresso às aulas

É o meu último dias de férias. Amanhã regresso à agitação de mais um ano lectivo: aulas, reuniões, fichas e mais fichas e as nossas "corridas" até ao portão para fumar um cigarrinho stressado. Confesso que sinto a falta desse outro mundo que é a escola, mas também sei que daqui a um mês começarão as habituais lamúrias do "estou farta", "estou cansada", "não dou conta de tudo", etc. Sempre quero ver que horário me vai sair na rifa.


Para uma pessoa muito especial

sábado, 28 de agosto de 2010

O que é a vida?

Boa pergunta! Hoje estou, sem dúvida, dada a questões tolas, mais do que batidas e sem resposta. Prefiro enveredar por uma das grandes questões dos Existencialistas : "Será que a vida merece a pena ser vivida?" A resposta depende não apenas da forma como a encaramos a vida, mas também daquilo que dela fazemos.

A vida é o estarmos por cá neste mundo, fruto de duas células que se encontraram. A vida, a nossa vida, resulta do meio em que nascemos, do poder que a família e a sociedade exercem sobre nós, com os seus códigos éticos, as suas normas. Resulta, também, da nossa própria personalidade, dos nossos desejos, dos nossos medos e também daquilo que vemos e projectamos nos outros.

A vida pode e deve ser vivida de forma gratificante, sem pesos nem mágoas. Basta apenas que nos consciencializemos que somos finitos e que um dia seremos confrontados com tudo aquilo que não fizemos e podiamos ter feito.


terça-feira, 24 de agosto de 2010

Saudades

Sim. Tenho saudades tuas, apesar de tudo pelo que passámos. Não há um dia em que não pense em ti e já lá vão 5 anos que me deixaste. Revejo-te como eras - a rapariga de vestido às riscas, sentada no beiral, com o Sansão ao colo - afasto de mim aquilo que o tempo e a doença te fizeram. Tinha ainda tanta coisa para te dizer...
No dia em que morreste, acordei às 5 horas da amanhã em sobressalto. A essa mesma hora estavas a ligar para o meu pai, para lhe dizer que estavas pior, que estavas de partida.
Ficou em mim a tua centelha, o teu entusiasmo pela vida e a força com que lutavas pelas tuas convicções e ideais, a tua independência. Passo isso às novas gerações, porque o cordão não se partiu, é eterno.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

As matriarcas

Texto que se segue foi retirado do meu blog "Verbo ad verbum", parado desde 2008.

Lapa-Lisboa(1963)

A rua é uma das muitas de Lisboa, da Lisboa do antigamente - casas de estrutura pombalina, passeios calcetados a martelo e pejados de obras canídeas; cheiro a bairro, a fruta e a gritos de pregão.

Vivia-se a ditadura Salazarista e "Deus, Pátria e Família" eram coisas tidas como certas desde os bancos de escola.

As matriarcas avançam no passeio, calmas e decididas - a bisavó, a mãe, a avó (da esq. para a drt.). Três gerações e uma quarta em letargia no carrinho.

Sei que foi dia de baptismo, do meu baptismo - acto incompreensível esse o de verter águas frias e tidas como santas na moleirinha inocente de uma criança! As matriarcas nunca foram dadas a coisas da Igreja mas, conforme os hábitos da época, chamavam por Nossa Senhora nos momentos de aflição e baptizavam os rebentos com devoção estudada e nada sentida.

Na minha família as mulheres sempre prevaleceram. A bisavó, nascida em 1888, até era mansa na sua condição de doméstica e, apesar de desconhecer o alfabeto, não deixou de proporcionar às filhas a instrução que não tivera. A avó, essa, era um portento de sabedoria e poder de decisão - empregada dos Correios, exímia a operar com o telégrafo e tocadora de bandolim nas horas vagas, casou cedo e arrependeu-se. Foi uma feminista à sua maneira e vituperou, até ao fim dos seus dias, tudo o que era macho. Após a sua morte em 1993, o ceptro passou para as mãos da do meio (da foto) - a minha mãe -, uma doméstica por imposição, dizia, embora eu não me lembre de ela o ser no verdadeiro sentido do termo, pois pois foi sempre ela quem conduziu os destinos financeiros da família. Estudou pouco e a insatisfação pelo seu estado, a par de uma descrença absoluta na pureza das acções humanas tornaram-na temível.

As matriarcas avançam no passeio, calmas e decididas. Não sei quem tirou esta fotografia. Nunca o soube... por distracção.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Amor virtual ou real?

Coloquei a questão nestes termos, mas creio ser uma falsa questão. Actualmente os nossos meios de comunicação, nomeadamente a Internet, dão-nos a possibilidade de conhecer e falar com pessoas que estão a milhares de quilómetros de distância. O processo de contacto inverte-se - no quotidiano, dito real, sentimo-nos atraídos pelas aparências físicas e só depois entramos no "tu", no "eu", no "nós", através de um maior ou menor período de convivência e, quantas vezes, a personalidade do outro contraria o rosto belo e o corpo atraente; nesse mundo, dito "virtual", entramos directamente em contacto e de forma livre com o outro, despido de pele, cor e cabelos. Quando não há fingimentos, manipulações...quando o "eu", o "tu" se dão com sinceridade absoluta, surge o amor. Virtual? Não. Amor real. Amor-paixão que a distância desafia, põe à prova.
Dizem que não há amor que sobreviva à separação dos corpos, mas não será ele uma forma sublime de união para além do material? Dizem que o amor se constrói numa convivência quotidiana, entre quatro paredes, com todos os aborrecimentos e rotinas inevitáveis que se têm de ultrapassar a dois. Não será a distância uma prova maior de resistência, que predispõe os amantes para o aperfeiçoamento de um quotidiano possível? Amar e ser amado, mesmo sem o toque, não é uma dádiva? Para mim sim. E não há distância geográfica que acabe com este sentimento, porque podemos estar com o outro, nesse mundo determinado como real, lado a lado, sentados num qualquer meiple em frente a uma TV e a milhas de distância emocionalmente.
Amar e ser amado...o que é a distância num universo imenso em expansão - sentimento, certeza, liberdade, fusão com algo muito superior ao material. Voar, voar...mea culpa.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Marraquexe - I

Final da tarde. Já não se vê o Sol. Ao longe, nos limites entre o céu e a terra, sobre o casario cor de barro, uma linha alaranjada no céu azul, anuncia o fim do jejum. Por toda a cidade ecoa o som estridente de uma sirene, seguido do apelo à oração: "Alláho akbar, Alláho akbar...". Abro os braços, esqueço-me de mim, fundo-me ...Ach hado an lá ilaha illaláh...sou parte integrante de um espírito único. Sinto uma paz imensa e voo em liberdade num mar de emoções, sem medo. Regresso ao primordial, à minha essência...não sou nada...faço parte, de algo muito maior, muito mais grandioso e intangível.



domingo, 15 de agosto de 2010

Palavras

São tão fáceis de dizer, as palavras. São tão fáceis de construir as frases. Escolhem-se os clichês, os modelos de conversação que se julga resultar sempre.
Preadador versus presa. Quem é quem?
Palavras são tão fáceis de escrever. Sentimentos são tão fáceis de inventar. Um poema, enviado na altura certa, faz derreter a alma mais ingénua, carente.
Predador versus presa. Quem é quem?

Aquila no capit muscas


Mentiras virtuais

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Camille Claudel - a sombra

Escultora genial, "mulher que não conseguiu ser", Camille Claudel nasceu fora do seu tempo. Ainda hoje, o seu nome se encontra associado ao do seu amante Rodin. Este ganhou a fama, Camille ganhou as trevas. É possível que, enquanto jovem aprendiza do grande escultor, a suas ideias e criatividade tenham servido para enriquecer a obra do seu mestre.
Camille enlouqueceu, dizem. Considerou Rodin um ladrão de ideias e encerrou-se no seu atelier, onde, começou a destruir à martelada todas as obras que acabava. Foi encerrada num manicómio. "Censuram-me - oh, crime espantoso! - o facto de ter vivido sozinha", escreveu Camille em 1917.




Calor

Denso, pesado, o calor abate-se sobre a cidade, sobre mim.
Abafo!
Quero a frescura da água, do vento, da noite que tudo acalma e cala.
Quero o silêncio da palavra escrita, de um olhar que grita.
Quero e não quero que este calor acabe...

A serra arde. Há chamas, fogo intenso.
Chamas que matam, cinzas que ficam. Sonhos desfeitos, vidas roubadas.

Vou mergulhar, esperando o fim do Estio...



segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Afinal, até sou capaz

Desde pequena sempre ouvi dizer que existem tarefas que os homens desempenham melhor do que as mulheres - eles mais dados às bricolages, aos motores dos carros, às "engenhocas", às electrónicas e computação e por aí fora; elas mais dadas às tarefas domésticas básicas, à maternidade, ao mundo da família, da estética e das sensibilidades. A lista é extensa, por isso não vou aqui colocá-la e muito menos expôr as novas teorias sobre o funcionamento do cérebro dos homens e das mulheres.
Não fui propriamente educada nesse sentido - nasci nos anos 60 e os meus pais tinham outras ideias. É verdade que recebi bonecas e tachinhos em vários Natais e aniversários, mas havia outras coisas, como os Legos, os livros, os puzzles. Contudo morria de inveja da pista de automóveis do meu primo e do seu ActionMen e, mais tarde, sonhava com os kits das naves do filme "Star Wars"...mas eram muito caros.

Adiante. Como toda e qualquer mulher (salvo excepções, porque as há), habituei-me a que um homem me resolvesse determinados problemas - o carro a perder água; furar uma parede; resolver um problema eléctrico ou montar um móvel. Partia do princípio que era incapaz de resolver certas situações e, confesso, era um pensamento cómodo, baseado numa partilha sexista da divisão de tarefas que eu não engolia muito bem.

Agora não há homem...nem quero que haja (a sua manutenção dá mais chatices do que um carro), por isso tenho de resolver sozinha aquilo que antes julgava não ser capaz, enquanto mulher.
O meu carro teve problemas - levei-o ao mecânico e disse-lhe: "Explique-me tudo. O que tenho de verificar, como se faz, etc". Explicou-me e retive. Afinal, não era tão difícil como isso.
Comprei um móvel biblioteca, como já contei num post anterior. Fiquei a olhar para aquele enorme monte de embalagens, um bocadinho à toa. O meu primeiro pensamento foi...vou pedir ajuda a um homem. Mas, felizmente, esse homem não estava de imediato disponível e aquelas embalagens todas a atravancar o meu corredor aborreciam-me. Deitei mãos à obra, com uma paciência de Job, sem uma aparafusadora eléctrica, com os guias de montagem, algumas chaves de parafuso e um martelo. Resultado? Suei, esfolei os joelhos no tapete, ficaram-me a doer os pulsos e a palma da mão direita, mas montei os sacanas dos móveis, sem falhas. Afinal, sou capaz...até sou capaz. OK, não consegui colocar as portas de vidro numa das estantes, mas por uma única e simples razão - não vem nenhum esquema de montagem na caixa e parece-me que é necessário um berbequim, que eu não tenho. Aguardo, ansiosamente, a chegada do meu amigo para finalizar a montagem, mas não trás berbequim...hum...vamos ver.

Prioridade número um: comprar um berbequim e uma aparafusadora eléctrica (talvez exista o dois em um).
Prioridade número dois: resolver o problema de cabos eléctricos e conseguir escondê-los em caixas ao longo dos rodapés e conseguir montar candeeiros.

Eu consigo. afinal até sou capaz.