terça-feira, 31 de maio de 2011

Nada

Era uma vez o Nada.
Que nada era já eu o sabia mas, mesmo assim, achei que algo fosse.
Por isso teimei naquelas que para mim eram evidências daquilo que eu julgava ser alguma coisa.
Inevitavelmente apercebi-me que nem evidências, nem nada havia onde pensava haver, porque o nada é assim mesmo - inexistência, vazio.
Nada a fazer, a não ser revoltar-me contra esse Nada, que não tendo razão de ser, teima em tomar o meu tempo com...nada.
Ora o tempo desperdiçado assim é pura perda dele, o que me leva a uma questão final: ou tudo ou nada?
Tudo, certamente.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Aurea Mediocritas

Só vive feliz quem se contenta com pouco e com aquilo que tem sem aspirar a mais - é esta a ideia que Horácio, poeta latino, procurava afirmar com a expressão Aurea Mediocritas...mediocridade.

Contentarmo-nos com pouco em nada contribui para a nossa evolução, pois é no mais que nos realizamos. O medo do desconhecido, do fracasso, faz-nos permanecer no mesmo, no certo e seguro. Resta, depois, a dúvida do que poderia ter sido a nossa vida, se tivessemos vencido esse medo e abandonado a mediocridade.
Felicidade? Só no simples não contentar-me já me sinto feliz.


domingo, 8 de maio de 2011

A casa

A sua casa era o seu reino e nele havia de tudo um pouco - candeeiros de diferentes formas e feitios; tapetes pequenos, médios e grandes, multicores; almofadas e mais almofadas,lisas, bordadas, com e sem franjinhas; móveis, um quase nada e livros, muitos livros em pilhas que ameaçavam desabar, mais outros tantos filmes sobre todos os assuntos possíveis e imaginários. A sua casa era assim como que um espaço em que tudo tinha uma razão de ser, uma ordem na aparente desordem. Cada objecto tinha um significado e um local certo para estar, embora nem sempre, para quem visse de fora, houvesse qualquer relação lógica ou estética na disposição do dito.
Em ocasiões muito especiais, sobretudo aquelas que assinalavam os finais de um ciclo de vida, agarrava numa vassoura resistente e desatava a varrer aqueles cantos da casa que já não faziam mais sentido e tinham de ser atirados para o contentor do esquecimento. Iam-se assim, com gestos bruscos, as porcelanas mais finas que criara com amor e que lhe pareciam, então, peças de um mau gosto tremendo. Iam-se assim, sem hesitação, quadros onde desenhara momentos que julgara únicos e até livros cujo conteúdo julgara brilhante, mas que haviam ganho o cheiro de romance de cordel.
Feita a limpeza, a casa ganhava novos espaços, limpos de passados, desejosos de futuro. Um futuro com novas cores que escolheria criteriosamente; com novos objectos que acariciaria sempre que passasse por eles, sem nunca deixar que o pó os fizesse esquecimento.
A sua casa é o seu reino. Um reino de realidades e fantasias, tão suas, que ninguém as pode entender e só a alguns, muito poucos, é permitido entrar.